Sinais de abuso sexual infantil podem ser detectados, diz magistrada

Ao comentar levantamento da Superintendência do Observatório de Segurança Pública, vinculada à Adjunta de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública de Mato Grosso, que mostra o crescimento dos casos de violência física e abuso sexual contra crianças no estado, a juíza Hertha Helena Rollemberg Padilha de Oliveira (Foto), 2ª-vice-presidente do Instituto Paulista de Magistrados (IPAM) e idealizadora e coordenadora do Projeto Eu Tenho Voz na Rede, afirmou nesta segunda-feira (28), que os sinais desses tipos de maus tratos podem ser detectados no dia a dia, e que isso pode impedir o seu prosseguimento.

Segundo o estudo da Sesp-MT, de janeiro a abril deste ano, foram registradas 320 ocorrências de natureza criminal relacionadas ao abuso sexual de crianças de zero a 12 anos de idade em Mato Grosso, e o levantamento mostra que a maioria delas ocorreu dentro de casa: 72%. “Outro local” foi apontado em 41 registros (13%); via pública em 24 (8%); pela internet em 11 casos (3%); propriedade rural foi responsável por 6 registros (2%); em comércio foram três, enquanto escola (pública e privada), veículo e clube social foram os locais com dois casos cada.

“Com a pandemia os números de abuso sexual só tendem a aumentar, porque a criança fica reclusa em casa com seus abusadores. É importante que familiares, vizinhos e integrantes das comunidades em que esses tristes episódios acontecem saibam reconhecer os sinais revelados pelas vítimas e também como fazer a denúncia aos órgãos e entidades dedicados à prevenção e combate a essas situações de violência, para protegê-las dos abusos cometidos”, afirma a magistrada.

A juíza Hertha Helena de Oliveira ressalta que “a criança muda seu comportamento repentinamente. Pode ficar agressiva e antissocial; fazer brincadeiras sexuais persistentes, exageradas e inadequadas; ter dificuldade de reter as fezes ou urina; chegar mais cedo à escola e demonstrar má vontade de voltar para casa; se isolar, ter fraco ou nenhum relacionamento com seus colegas e imensa dificuldade de estabelecer vínculos de amizade; ter muitas faltas e não participar de atividades escolares e sociais; dificuldades de concentração nas tarefas escolares; queda repentina no desempenho escolar; total falta de confiança nas pessoas, em especial nas pessoas com autoridade; medo de adultos do sexo oposto ao seu; alterações do sono e medo de dormir; quadros de depressão e ansiedade, ideias suicidas, vontade de fugir de casa e automutilação”, enumera.

Diante do aumento da violência durante a pandemia, o IPAM lançou o Projeto Eu Tenho Voz na Rede, com o objetivo de prevenir e combater o abuso sexual de crianças e adolescentes por meio de informação e sensibilização. A iniciativa, que é realizada de forma presencial desde 2016, passou a ter uma versão totalmente on-line, com maior abrangência e alcance. “Com o aumento de casos durante a pandemia, resolvemos criar a versão digital do projeto, porque esse trabalho de prevenção e sensibilização das crianças e dos jovens precisa continuar e ser cada vez mais intensificado, já que as estatísticas não param de subir”, afirma a magistrada.

Projeto Eu Tenho Voz foi criado para levar informação e sensibilizar crianças e adolescentes sobre a violência e o abuso sexual, e ao mesmo tempo capacitar para lidar com o problema os professores e educadores das escolas do Ensino Fundamental I e II e dos centros comunitários da Capital e de cidades do Interior do Estado de São Paulo.

Os estudantes têm contato com o tema no seu principal reduto de confiança, que são as escolas. Por meio da apresentação da peça “Marcas da Infância”, criada pela Cia NarrAr Histórias Teatralizadas, o projeto procura mostrar que a voz das vítimas é sua maior defesa contra o abuso sexual, e que há sempre alguém em que elas podem confiar.

A juíza Hertha Helena de Oliveira diz que, quando o projeto foi criado de forma presencial, crianças começaram a fazer denúncias desde a primeira apresentação. “Os alunos assistem à peça sempre acompanhados por seus professores e por um juiz, nunca sozinhos. Muitas denúncias são feitas aos juízes e outros voluntários do projeto, que acompanham as apresentações. E nem sempre fazem a denúncia naquele momento. Muitas vezes eles procuram depois um professor de confiança para contar a violência de que são vítimas”.

As novas versões das narrativas, “Marcas na Nuvem”, são quatro vídeos especialmente produzidos para o Projeto Eu Tenho Voz na Rede, inspiradas em casos reais, que foram atendidos pelo Projeto Eu Tenho Voz presencial. Após a exibição das narrativas nas escolas, os juízes voluntários do projeto interagem, por vídeo conferência, com as crianças e professores, esclarecendo como buscar ajuda.

“Dados de 2019, mostrados no Fórum Nacional de Segurança, antes da Covid-19, revelaram que 66.041 casos de abuso sexual foram contra crianças e adolescentes, a maioria deles ocorreu na própria residência da vítima, ou de alguém próximo a ela.

Outro dado relevante que a magistrada detalhou é que a escola é o local mais seguro e que oferece às crianças e adolescentes melhores condições de denunciar os abusos. “O professor é a pessoa de maior confiança da criança e do adolescente para denunciar casos de abuso e exploração sexual. A escola precisa estar aberta para ouvir esses alunos, além de proporcionar educação sexual, que é a melhor forma de prevenção”.

Por essa razão, o IPAM criou o “Curso de Capacitação Básica para Prevenção e Combate ao Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes”, que será apresentado totalmente online para capacitar os professores e educadores que participarão do Projeto Eu Tenho Voz na Rede. “O papel do professor não é investigar, mas acolher e direcionar a denúncia para a autoridade competente, além do papel preventivo, inerente à própria atividade educativa. Por essa razão o papel do educador é fundamental para contermos esses números crescentes de violência contra os nossos jovens”, conclui a juíza.
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